sexta-feira, 21 de agosto de 2020

Os Tremoceiros do Casal da Quinta - a origem da alcunha!

 

Os habitantes da aldeia de Casal da Quinta, freguesia de Milagres, concelho de Leiria, eram conhecidos pelas populações vizinhas por Tremoceiros… 

                                 Uma alcunha com a qual se identificam até aos dias de hoje. 

 Esta simpática alcunha de Tremoceiros deve-se ao facto de, no passado, o cultivo do tremoço ser muito comum nos campos da aldeia.


 Era muito frequente o consumo deste petisco entre a população, sendo um alimento essencial para todas as famílias da aldeia.

 Sendo todas as famílias de origem humilde, em tempos de fome, era comum as mães darem tremoços salgados aos filhos para que estes bebessem muita água e ficassem de estômago cheio. 

                        Desta forma conseguiam enganar-lhes a fome por uns tempos. 



Este alimento era essencial na alimentação das gentes e era utilizado em todas as ocasiões festivas.

 Era um belo petisco domingueiro que sempre se oferecia aos vizinhos e às visitas da casa.


 No dia do bolinho, dia de Todos os Santos, era um dos presentes dados a todas as crianças, que percorriam todas as casas da aldeia.

 Elas os aceitavam ansiosas, exceto os dados pela TI Sarneira, uma velha solitária, desmazelada e muito suja que todos os anos lhes dava tremoços negros e malcheirosos que a garotada atirava para a borda do caminho.   

                                 

     

Nesta pequena aldeia o comércio dos tremoços foi muito significativo no passado, chegando a existir três tremoceiras em simultâneo. 

Estas mulheres andavam de porta em porta, com as poceiras à cabeça, a vender quartas e oitavas, medidas comuns apresentadas em forma de cubos de madeira.


Os tremoços, que eram cultivados e preparados na própria aldeia, eram colocados de molho e depois cozidos em água e cinza. 


Depois de cozinhados eram bem lavados e colocados em sacos de linhagem. Estes eram depois levados para as presas, ribeiros ou poços com água corrente onde estavam de molho por vários dias. Só depois de deixarem de ter um sabor amargo é que eram servidos com sal.


Os habitantes da aldeia eram mesmo muito apreciadores deste alimento, um gosto bem conhecido pelos vizinhos das outras aldeias.


Aos domingos, quando ainda não existia a capela da aldeia em honra a S. António, as pessoas iam às missas às capelas das aldeias vizinhas de Milagres, Bidoeira de Cima ou Boavista.
E, como era hábito, à saída das missas as tremoceiras vendiam pevides, pinhões e os tremoços.



 Como por essa altura não existiam sacos de plástico ou de papel, as mulheres colocavam os tremoços nas suas sacas de pano e os homens nos bolsos dos casacos. 


Diz-se que, com o passar do tempo, estes bolsos  dos casacos dos homens chegavam a ganhar ranço com tanta sujidade acumulada mas, como também dizem os mais velhos, tudo se comia e nada fazia mal!


 No regresso, as gentes voltavam a pé e descalços e em grupos às suas casas, e durante a viagem iam comendo os tremoços, atirando as suas cascas para o chão. 

Como se deslocavam em grandes ajuntamentos, a quantidade de cascas deveria ser grande pois os ranchos de gentes das outras aldeias que seguiam os mesmos caminhos, facilmente identificavam quem antes tinha passado por esses caminhos. 

E sabendo que eram ranchos de gente  do Casal da Quinta, colocaram-lhes a alcunha de Tremoceiros.


Ainda hoje os habitantes locais se identificam com esta alcunha e continuam a comer  os deliciosos tremoços.

 Continuam com a ter fama e… o proveito!

 


Adaptação do livro de autor “Pequenas histórias de uma Pequena aldeia – Histórias da tradição oral da aldeia de Casal da Quinta, Milagres, Leiria” com recolha, adaptação e ilustração de Rosário Sousa, 2012


1 comentário:

  1. A minha avó era tremoceira em Barcelos. Chama-se Isaura Lopes Serafim, mas a idade já não lhe permite vender porta a porta. Ela não vendia o tremoço a peso, carregava o cesto na cabeça já com sacos cheios para vender ao saco. Tenho memórias de infância de a ver a colher o tremoço , a ferver, a pôr de molho...e que lindo é recordar.

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